Um bate papo aqui de fora
“Fica no elevador” eu grito pra ele como faço com todas as visitas que chegam aqui em casa. O elevador chega direto no apartamento, mas é preciso a chave de casa. Então quando alguém chega a gente sempre diz pra pessoa ficar dentro e chamamos o elevador.
Meu coração esta disparado. Faz tanto tempo que evito esse momento. Perdi a chance de recebê-lo na minha última casa, onde queria mostrar e contar tudo que conquistei.
O elevador ja faz um barulho anunciando que está próximo. Eu, como sempre, estou quase fazendo xixi na calça, como em qualquer momento de nervoso. A última vez que isso aconteceu foi quando nos despedimos.
Meu corpo paralisa, eu não sinto mais minha pele, por mais que ainda sinta cada pelinho do braço levantando suavemente. A porta abre lentamente, como se o tempo fosse parar naquele instante e fosse tudo um sonho.
“Oi” logo dou um abraço nervoso e tímido e digo “bem vindo a minha casa!”
Eu quero poder demonstrar na minha voz que eu estou feliz e tendo agir descontraída, mas está difícil.
Ele entra com uma cara tão feliz ja dizendo o quão lindo o apartamento é. Eu me seguro pra não confessar “é o mais lindo, mas de longe o lugar mais feliz que ja estive”. Calma, eu penso, vocês tem tanto pra conversar até entrar na parte de confessar tudo que dói.
“Que pena que tu nem chegou a ver o outro, pai. Ele era lindo! Mini, porém lindo. Esse tem sacada, vai ali fora ver a vista, o sol esta se pondo e o céu esta alaranjado. “
“Queria te receber dessa vez de novo com um copinho de cerveja, umas daquelas daqui que tu gostas tanto” eu falo algo tentando manter a conversa do lado de dentro do apartamento. “Mas eu preciso confessar” falo com a voz ja mais baixa, enquanto me aproximo da porta e ele entra. “Marquei esse encontro somente por mim. Não quero te atualizar sobre como está o mundo, a mãe, o Brasil ou qualquer outra coisa.” A voz começa a ficar tremula. “Quero te contar como eu estou. Eu preciso da tua ajuda.” Eu o abraço e sinto o cheiro dele. Meu deus, como isso é divino.
Eu choro, mas choro pouco. Tudo que eu menos quero na vida é magoa-lo ou faze-lo sofrer também.
“Eu sei pai, eu sei que depois de tudo tu és muito mais forte. E é por isso que te quis tanto aqui.”
Ele me olha com um olhar sereno e eu choro. Choro tanto que poderia dizer que passaram-se horas.
Tentando manter a espontaneidade que sempre tivemos, eu saio do peito dele e limpo o rosto. “Quer saber? Tem cerveja na geladeira e vou abrir uma pra nós.”
“Verdade, a ultima vez que os falamos foi em 2016. Sim, estas certo muita coisa mudou. Mudou dentro por que la fora tudo continua igual. Eu é que não conhecia o mundo. Isso é ser adulto, pai?”
Ele estende o braço com o copo na mão e enquanto eu vou virando a latinha de cerveja eu analiso cada centímetro da pele dele. E rio, percebendo o dedinho torto dele.
“Sabe, eu queria falar tanto, perguntar tanto, mas ja está tudo melhor. Só em te olhar eu ja vejo tudo mais claro e mais bonito.” Pego o meu copo, agora também cheio e dou um passo para fora, ja sentindo o cheiro do ar gostoso.
Arrumando o sofa do lado de fora, com as almofadas, percebo um sorriso leve no canto esquerdo da minha boca. Tão natural e forte que minha bochecha dói.
“Agora vem aqui pra fora, quem sabe com o tempo eu consiga te contar….”